Algumas boas histórias começam com uma Maria. E a história do tênis no Brasil não é diferente, também protagonizada por uma Maria. Mas não qualquer uma: é uma Maria que se tornou lenda, quase um mito, e que ainda hoje é inspiração para as novas gerações do esporte. É Maria Esther Bueno.
Não é nenhum exagero dizer que Maria Esther Bueno andou para que atletas como Bia Haddad pudessem correr. Isso porque as duas nasceram em São Paulo, ambas são tenistas excepcionais e as duas chegaram às quartas de final em Roland Garros. Mas apenas uma delas tem o título de “bailarina do tênis”, e esse nome pertence a Maria Esther Bueno.
Bueno não foi eleita a melhor tenista do século XX da América Latina e nem uma das cem melhores tenistas do mundo à toa. Afinal, ela se aposentou com um legado formado por 71 troféus, sendo 19 deles somente em campeonatos do Grand Slam. Isso sem mencionar o total de 589 títulos ao longo da carreira. A seguir, então, conheça um pouco mais sobre essa verdadeira lenda do tênis mundial:
O início de tudo
Com apenas seis anos, a pequena Maria Esther Andion Bueno começou sua vida no tênis, praticando no Clube de Regatas do Tietê, com o irmão. A paixão dos dois fora herdada do pai, Pedro Augusto, um tesoureiro que também era grande apreciador do esporte. Assim, os irmãos basicamente atravessavam a rua sempre que podiam para, juntos, se dedicarem ao esporte no Clube.
No entanto, o que poderia parecer uma simples brincadeira para muitos, para a jovem Maria Esther logo ficou coisa séria. Aos 14 anos, ela ganhou seu primeiro título nacional e, desde então, seu caminho no tênis foi sempre ascendente. Aos 18, após conseguir a passagem de ida com a ajuda do clube e “se virar” para conseguir a volta, a paulista foi para os Estados Unidos.
Vale destacar que, na época, era difícil algum atleta brasileiro se destacar no tênis internacional. Afinal, sem patrocínios, era complicado participar de tantas competições fora do país. Então, Maria Esther viajou consciente da responsabilidade que estava em suas mãos. Mas o esforço valeu a pena: lá, a jovem tenista conquistou o Orange Bowl, um importante torneio juvenil realizado na Flórida.
Mas ninguém sabia que o melhor ainda estava por vir…
Maria Esther Bueno faz história em Wimbledon
Em 1959, Maria Bueno tinha apenas 19 anos quando marcou seu nome a ferro e fogo na história do tênis mundial. Naquele ano, em Wimbledon, o principal torneio de tênis da Inglaterra, Esther foi a cabeça de chave número seis. Na estreia, ela enfrentou a britânica Pauline Edwards e venceu sem sustos. Em seguida, vieram a alemã Margot Dittmeyer e a norte-americana Mimi Arnold em dois confrontos um pouco mais duros.
Na quarta rodada, foi a vez da brasileira enfrentar a neozelandesa Ruia Morrison em um jogo equilibrado. Na sequência, então, Esther encarou Edda Budding e Sally Moore, uma alemã e uma norte-americana de novo. Mas, após suar bastante, avançou no Grand Slam britânico.
Até que chegou o momento da grande final contra a também norte-americana Darlene Hard. E, trocadilhos à parte, a partida contra Hard não foi, assim, tão dura. Maria Esther venceu Wimbledon pela primeira vez, fechando a partida com parciais de 6/4 e 6/3.
Assim, a brasileira se tornou a primeira no ranking mundial e levou o Brasil ao topo do mundo do tênis. Pela primeira vez, o esporte ficou popular no país. Na volta, Maria Esther teve a recepção que merecia, com direito a receber das mãos do então presidente Juscelino Kubitschek uma Medalha de Mérito Esportivo, desfile em carro aberto e mais. Ela chegou a ganhar uma homenagem dos Correios em uma edição comemorativa de selos.
Já na Inglaterra, a Maria Bueno, como ficou conhecida por lá — ou apenas Estherzinha, para os mais próximos — ganhou o respeito da família real britânica. E foi de lá, inclusive, que veio o apelido de “bailarina do tênis”. Isso porque Maria se deslocava pela quadra durante as partidas de forma graciosa, como se estivesse dançando.
Mas a proximidade da nossa Rainha do tênis com a realeza britânica ficou ainda maior. Tanto que, mesmo anos depois de sua primeira conquista, se tornou relativamente comum que a brasileira “jogasse bola” com a princesa Diana e seus filhos, os príncipes Harry e William.
A lista de vitórias de Maria Esther Bueno cresce
Nos anos seguintes, Maria Esther Bueno seguiu pavimentando seu caminho como a maior tenista do Brasil e uma das maiores do mundo. Assim, em 1960, ela repetiu seu feito em Wimbledon, mantendo sua posição no ranking de melhor do mundo, onde permaneceu por mais duas temporadas.
Mas no mesmo ano, a paulista foi além e se tornou campeã dos quatro Grand Slams do ano na categoria duplas, jogando ao lado, justamente, de Darlene Hard — aquela que ela havia derrotado na final do torneio britânico no ano anterior.
Infelizmente, nos anos de 1961 e 1962, Maria Esther Bueno precisou se afastar um pouco das quadras para cuidar de uma série de lesões. O retorno em 1963, no entanto, foi triunfante, com Bueno conquistando o US Open e seu tricampeonato em duplas em Wimbledon. Assim como também foi neste ano que ela ganhou o ouro no simples e a prata nas duplas nos Jogos Pan-Americanos, realizados em São Paulo.
Mas há um detalhe que nem todos sabem sobre sua participação no Pan: que na época, ela precisou lidar com uma lesão inusitada. Acontece que, um dia antes do início do torneio, Bueno estava brincando com seu cachorrinho. Então, acidentalmente, ele mordeu a mão direita da tenista, que era conhecida justamente por sua técnica como destra.
Assim, entre pontos nos dedos e visitas diárias ao médico, Maria Esther enfrentou a dificuldade para segurar a raquete e conseguiu subir ao pódio.
Podemos então afirmar que a década de 1960 viu o auge da carreira de Maria Esther Bueno. Afinal, em 1960, ela conquistou seu terceiro título individual em Wimbledon. Enquanto isso, em 1965 e 1966, ela foi campeã mais duas vezes na grama sagrada da Inglaterra, mas na categoria duplas. E também foi nesse período que ela ganhou o Aberto da Austrália e Roland Garros.
A chegada da aposentadoria
Considerar a história de Maria Esther Bueno no esporte é lembrar que ela conquistou tantos títulos em uma época em que não havia patrocínios milionários, nem redes sociais para compartilhar as vitórias com o mundo. Até o próprio tênis feminino ainda era muito amador. Para dar uma ideia, a Associação de Tênis Feminino (WTA) surgiu apenas em 1973.
Assim, a década de 1970 viu a brasileira diminuir significativamente seu ritmo de competição. A chegada de diversas lesões no braço e nas pernas, tão comuns a atletas do esporte, também contribuíram para isso. Assim, seu último título veio em 1974, no Aberto do Japão. Em 1977, então, Bueno anunciou oficialmente sua aposentadoria e, em 1978, foi indicada ao Hall da Fama do tênis.
No entanto, Maria Esther Bueno nunca pendurou as raquetes em definitivo. Isso porque ela sempre esteve ligada ao esporte, participando de partidas de exibição e eventos beneficentes o quanto pôde. Esther também manteve sua rotina de treinos, tamanho amor tinha pelas quadras. Em 2017, a tenista foi diagnosticada com um câncer. Em junho do ano seguinte, aos 78 anos, ela faleceu.
Os números de Maria Esther Bueno
Somando-se todos os títulos de sua carreira, Maria Esther Bueno alcançou 589 pódios. Somente em Grand Slams, são 19 troféus. Veja a seguir um resumo das principais conquistas da tenista:
Aberto da Austrália
Simples
- Finalista em 1965
Duplas
- Vencedora em 1960 (com Christine Truman)
- Semifinalista em1965 (com Norma Baylon)
Duplas mistas
- Semifinalista em 1960 (com Bob Howe)
Aberto da França
Simples
- Finalista em 1964
- Semifinalista nos anos de 1958, 1960, 1965, 1966
Duplas
- Vencedora em 1960 (com Darlene Hard)
- Finalista em 1961 (com Darlene Hard)
- Semifinalista em 1964 (com Robyn Ebbern), e em 1968 (com Nancy Richey)
Duplas Mistas
- Vencedora em 1960 (com Bob Howe)
- Semifinalista em 1958 (com Jean-Noel Grinda) e 1964 (com Tomas Koch)
Wimbledon
Simples
- Vencedora nos anos de 1959, 1960 e 1964
- Finalista em 1965 e 1966
- Semifinalista em 1962
Duplas
- Vencedora em 1958 (com Althea Gibson), 1960 (com Darlene Hard), 1963 (com Darlene Hard), 1965 (com Billie Jean Moffitt) e 1966 (com Nancy Richey)
- Finalista em 1967 (com Nancy Richey)
- Semifinalista em 1962 (com Darlene Hard) e 1964 (com Robyn Ebbern)
Duplas mistas
- Finalista em 1959 (com Neale Fraser), 1960 (com Bob Howe) e 1967 (com Ken Fletcher)
- Semifinalista em 1962 (com Bob Howe) e 1965 (com Dennis Ralston)
Aberto dos Estados Unidos
Simples
- Vencedora nos anos de 1959, 1963, 1964 e 1966
- Finalista em 1960
- Semifinalista em 1962, 1965 e 1968
Duplas
- Vencedora em 1960 (com Darlene Hard), 1962 (com Darlene Hard), 1966 (com Nancy Richey) e 1968 (com Margaret Smith Court)
- Finalista em 1958 (com Althea Gibson), 1959 (com Sally Moore) e 1963 (com Darlene Hard)
Duplas mistas
- Vencedora em 1960 (com Tony Palafox)
- Finalista em 1958 (com Alex Olmedo), 1960
- Semifinalista em 1959 (com Alex Olmedo) e 1964 (com Dennis Ralston)